ORIENTADOR LITERÁRIO

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IRONIA

O pior sintoma das depressões mais profundas 

é não esperar mais nada da vida.

 A ironia é que o mesmo define, também, 

quem conquistou tudo o que nos ensinaram a desejar.

Edmir StClair 


O SEGREDO DO MARKETING

 

   Diz a lenda que certa grife mundial, cansada de vender bolsas que custavam mais que apartamentos, resolveu testar um limite ainda não explorado: o da estupidez vaidosa da humanidade.

O plano era simples — tão simples que beirava a genialidade. Criaram um produto chamado A CAIXA. Só isso. Nenhuma descrição, nenhuma promessa além da propaganda oficial:

“Nada menos do que muito poucos merecem.”

O preço? Astronômico, naturalmente. Acessível apenas para quem já não sabia mais onde gastar dinheiro.

O anúncio de que seriam produzidas apenas mil unidades desencadeou uma corrida insana. Iniciou-se a venda no escuro: ninguém sabia o que estava comprando, mas todos estavam dispostos a pagar. A fila de pretendentes atravessava continentes. Bancos suíços receberam transferências milionárias antes mesmo de confirmarem os nomes. Políticos, artistas, donos das maiores hi-techs, sheiks do petróleo e magnatas de todas as nacionalidades apelaram a todas as conexões possíveis para garantir um lugar entre os compradores eleitos.

Em pouco tempo, instalaram-se negociações discretas nos bastidores: convites trocados por favores, promessas de influência, silenciosos acordos de conveniência. O privilégio de estar entre os mil compradores passou a valer tanto quanto — ou até mais do que — a própria Caixa.

Em poucas horas, a lista de espera foi totalmente preenchida. E o mercado negro por um lugar na fila explodiu, atingindo valores indecentes.

O lançamento aconteceu em Nova York, no Madison Square Garden, transformado em templo da futilidade moderna. Sheiks árabes com turbantes cravejados de ouro, nobres europeus entediados, bilionários de todos os continentes: todos lá, ansiosos para botar as mãos naquilo que não sabiam o que era.

Mil compradores, mil caixas personalizadas. Segundo a grife, cada uma conteria um produto único, personalizado e exclusivo que representaria exatamente o valor de cada comprador para o mundo.

Luzes, drones, fogos de artifício. Um mestre de cerimônias, com voz de trovão, anunciou:

— Senhoras e senhores, eis o reflexo de quem vocês são!

Um batalhão de homens vestidos com smoking negro e postura solene entrou no enorme salão e passou a entregar cada caixa ao seu proprietário. A CAIXA era de madeira de lei escura, solene, e entalhada com o nome de cada comprador aplicado em ouro puro. Em cada mesa havia um pequeno biombo, para que cada magnata tivesse privacidade ao verificar o que havia dentro de sua caixa.

No instante da revelação, cada um dos mil compradores abriu sua caixa dourada personalizada, com o nome encrustado em pedras de rubi finamente lapidadas e elegantemente dispostas na tampa, acima da logomarca famosa, com a respiração suspensa.

O que encontraram lá dentro não foi uma joia, nem um artefato exclusivo, tampouco algum segredo da eternidade.

Dentro de cada caixa havia apenas uma folha de papel timbrado. Nela, em letras grandes e solenes, lia-se:

Você vale a mesma coisa que qualquer outra pessoa.

A surpresa foi grande — um choque íntimo, quase uma bofetada filosófica. Mas nenhum deles ousou demonstrar. Afinal, quem pagaria milhões para admitir em público que não valia mais do que qualquer outro?

Mais abaixo, em letras menores, uma instrução irrefutável:

“Não conte a ninguém o que você recebeu, nem pergunte o que os outros receberam. Nos comprometemos a nunca revelar o que você mereceu ganhar.”

Após o choque inicial, cada um dos compradores começou a encenar sua explosão de alegria diante da Caixa. O que se seguiu foi um espetáculo de hipocrisia: atuações dignas de Oscar. Cada qual tentava exibir mais felicidade, mais encantamento, mais êxtase que o outro. Sorrisos falsos, lágrimas de emoção forçada, abraços teatrais.

A plateia, composta de convidados e jornalistas, aplaudia com fervor, convencida de presenciar um momento histórico. As câmeras captaram lágrimas cintilantes e gestos de êxtase, transformando a farsa em verdade televisiva. Enquanto isso, os compradores seguiam à risca as instruções de sigilo, cada um se achando o maior idiota do mundo — mas sem deixar transparecer. E, claro, certos de que todos os outros haviam recebido algo muito mais valioso.

E assim, todos calaram-se envergonhados. Cumpriram à risca a ordem impressa, protegendo o segredo que os envergonhava.

No dia seguinte, jornais noticiaram o lançamento como o “espetáculo de marketing da década”. E a grife, naturalmente, anunciou um novo lote de caixas — agora pelo dobro do preço.

Ninguém jamais ousou romper o silêncio.

 

Edmir Saint-Clair 

DIRIGIR A SI MESMO

 Vivemos num mundo saturado de estímulos. Reagimos sem perceber, quase no automático, e confundimos movimento com direção. Mas o verdadeiro poder, a liberdade genuína, nasce de uma habilidade rara: influenciar a si mesmo. Nasce do nosso desejo de desenvolvermos o nosso poder de decidir nossas ações e de influenciar nossas reações.

 
O autoconhecimento é essa bússola interna. Ele revela o que nos move e o que nos paralisa; mostra, com uma clareza incômoda, as forças invisíveis que nos impulsionam ou nos freiam. Compreender nossas reações é um ato de protagonismo. Não se trata de reprimir sentimentos — eles são parte da nossa natureza — mas de interpretá-los, compreendê-los e canalizá-los de forma inteligente e consciente.

A neurociência já provou que pequenas ações, alguns truques, se repetidos com consistência, são capazes de redesenhar conexões cerebrais e criar novas rotas emocionais. É assim que nos tornamos alquimistas da própria psique.
Uma dessas transmutações é, para mim, um exercício diário: transformar ansiedade em animação. Não é metáfora — é fisiologia. Ansiedade e entusiasmo são irmãs quase gêmeas: ambas aceleram o coração, elevam a energia, inflamam o sistema nervoso. A diferença está na lente com que olhamos para essa energia. E isso faz toda a diferença na vida prática. 

Com treino e intenção, a troca de percepção se torna instantânea. O que antes ameaçava me paralisar, agora se converte em combustível criativo e desempenho afiado.

 
O resultado é simples: energia reorganizada, foco ampliado e a sensação concreta de estar no controle. Essa é a maestria de dirigir a si mesmo — uma jornada contínua, sustentada pela vontade pró ativa de viver com alegria e sentido.
Afinal, quem aprende a se conduzir jamais será conduzido pelos acasos da vida ou pela vontade dos outros.

 
Edmir Saint-Clair