COACH LITERÁRIO
MINHA CIDADE - Poesia
O MAIS TRÁGICO DE TODA ESSA TRAGÉDIA, É A BANDIDAGEM EXPLÍCITA E INTOCÁVEL CAPILARIZADA POR TODAS AS INSTÂNCIAS.
DENTRO DE MIM
Nele minha casa,
Na minha casa tem a minha rua,
Nela muitas avenidas,
Nas avenidas está meu bairro,
Dentro dele minhas cidades
Nessas cidades existem muitos países,
Dentro de cada um mundos inteiros.
E neles, todo o universo.
Dentro de mim.
- Edmir Saint-Clair
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SÓ EXISTE RESPONSABILIDADE INDIVIDUAL
Esse é o grande paradoxo sob o qual a humanidade se encontra. Individualmente somos fracos, necessitamos de um grupo para sobrevivermos, em muitos sentidos. Entretanto, somos tão individualizados em nossos sonhos, vontades, sentimentos e desejos, dada nossa própria natureza, que o coletivo nunca traduz as vontades de todos. Busca satisfazer à maioria, mas satisfaz apenas aos cabeças, aos líderes e seus próximos. O fascínio do poder, do comando, só existe por que seu oposto é tão forte quanto o fascínio de não fazer nada e ter tudo, a lei do menor esforço, que prefere se submeter por comodismo e covardia. Alguns terceirizam até seus pensamentos e opiniões.
O coletivo é forte quanto a força física de faz necessária. Seja manifesta ou apenas sugerida, como na democracia. Ou seja, o coletivo é uma forma primitiva de impor submissão pela força do grupo. Mas, o único que pode promover a evolução e a solução das questões que se apresentaram para a própria sobrevivência como indivíduo é o indivíduo. Soluções não só para si mas, também, para o grupo como tal. O coletivo só se impõe quando impõe medo ao indivíduo.
Pena que tenha tanta gente ainda nos primórdios do "juntar um grupo para bater e subjulgar o outro". Seja no braço, no tacape ou na mentira. O conhecimento e o desenvolvimento mental e tecnológico trarão respostas no futuro, certamente.
Estamos num momento extremamente delicado da humanidade. Velhos paradigmas já não servem mais e os novos são débeis e não apresentam conteúdo suficiente para substituir os antigos. Para sustentar séculos de colunas erguidas sob conhecimentos e percepções obsoletas.
CHEGA – Poesia
Chega de deixar tudo para amanhã
Chega de reclamar e não mudar
Chega de se omitir e não lutar
Chega de prometer e não cumprir
Chega de errar e repetir
Chega de chorar sem reclamar
Chega de julgar sem entender
Chega de não procurar saber
Chega de fingir, dissimular,
Chega de preferir ignorar
Chega de roubar sem precisar
Chega de se achar porque tem mais
Chega de mentir para se eleger
Chega de se eleger só para roubar
Chega de estudar só para mandar
Chega de saber só para enganar
Chega de não fazer acontecer,
Chega de mentir até mesmo pra você.
- Edmir Saint-Clair
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O ENTERRO DA DOR – Poesia
Abrir as portas fechadas do tempo,
Do
museu dos fantasmas,
Das
fotos penduradas, dos instantâneos da dor
Das
fraturas expostas que não latejam mais,
Instantes
que nunca passaram,
Congelados
no espaço escuro.
Imagens
desbotadas e inúteis
Expostas
com suas molduras de pregos,
Que
riem das mãos infantis que as esmurram sem parar.
O
choro é cova profunda, cavada à mão,
Rasgada
na carne, é terra cavada a unha,
Tirada
no sangue que rega o solo fértil
Cobrindo os rastros da cicatrização
Bendita
a hora de limpar as mãos,
Remover,
das unhas encardidas, a terra cansada
Resquícios
de um enterro sem velas,
O
início depois do fim,
Vôo leve da alma que conquistou a si.
SONHO É VERSO – Poesia
De
que são feitos os sonhos?
De
desejos, de paixões,
De
vontades, De ilusões,
De
necessidade, de fome,
De sede, De tesão
Há muitos tipos de sonhos,
Há muitos tipos de tudo,
Há o sonho que é esperança,
Outro que é melancolia,
Há o sonho que é vingança
E há outro que é poesia
O
sonho é um encontro consigo,
Com nosso caos mais real,
Sobre o qual não temos controle algum,
A pista que não leva a nada,
Ou o fio da meada,
A
visão mais profunda,
Um tempo que não existe,
Mas passa,
É
Maior que a rima,
É
um verso,
É
passeio no universo,
É
vislumbre do infinito,
É ilusão de ser eterno.
– Edmir Saint-Clair
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UM MINUTO
De
silêncio, de paixão, de prazer. O minuto anterior ao gozo, o gozo, um minuto de
êxtase, de felicidade, sem saber onde termina meu corpo e começa o seu. O olhar
que muda a vida em um minuto. O minuto feito de sessenta eternidades, mas a
eternidade terá sempre o último minuto. Cabe-nos viver intensamente todas as
nossas eternidades. Tudo que torna a vida maravilhosa não dura mais que um
minuto. Mas a dor é longa, e consome quase todos os nossos minutos. O presente
é sempre o minuto seguinte, mas só percebemos depois, não sabemos ser eternos.
Mas haverá sempre o minuto seguinte.
O
minuto de paz nos teus olhos, no silêncio da noite, no sorriso que brotou
espontâneo. O minuto feito de sessenta eternidades. A eternidade antes do
primeiro beijo, antes de desvendar teu corpo, antes de poder dizer que te amo,
antes de sentir teu amor.
A
eternidade depois do último beijo, depois de me acostumar com teu corpo, depois
de descobrir que ainda te amo, depois de sentir tua ausência. A eternidade de
chorar sozinho, o vazio profundo após a última lágrima.
O
último minuto com você, e o desejo desesperado de retornar ao primeiro.
Passamos a vida inteira atrás desses minutos, dessas sessenta eternidades, que
farão o resto valer a pena. Mas, só percebemos o valor do primeiro quando
chegamos ao último, e então já haverão se passado muitas eternidades.
O
último minuto em que nos amamos foi feito de sessenta despedidas, todas sem que
soubéssemos. E a dor, com o poder que só a dor tem, multiplicou sessenta por
sessenta por sessenta eternidades, e ainda estou a espera do último.
Em
que minuto te perdi?
Te
desejo por mais um minuto, seríamos felizes por sessenta eternidades.
- Edmir Saint-Clair
DESABAFO DE UM BRASILEIRO
O Brasil é, hoje, um país dividido. Não só entre correligionários desses arremedos de políticos. Mas, entre os que fazem parte da estrutura do poder e TODO o resto do povo.
Resto? Como assim, se somos a maioria? Como assim, se somos os patrões de quem deveria governar em nosso nome? Mas, basta olharmos para nós mesmos que não teremos dúvidas, somos o resto...
Enquanto o povo brasileiro se bate por políticos desonestos e corruptos (de TODOS os partidos), os mesmos celebram alianças para garantir que tudo continue como está. Em TODAS as esferas e instâncias, executivo, legislativo e judiciário.
Estamos regredindo de forma impressionante! Em tudo. Nos costumes, na cultura, nas crenças primitivas que se disseminam facilmente por uma população sem esperanças, criando um foco a mais de exploração da miséria brasileira.
Somos ignorantes, limitadíssimos intelectualmente. Afinal, como poderia ser diferente sem escolas e sem professores preparados, prestigiados e bem remunerados?
Discutimos e nos digladiamos por temas há muito ultrapassados na história do mundo civilizado. Estamos no século passado e caminhando a passos largos para o século XIX.
Nossos melhores cientistas, pesquisadores, pensadores e expoentes, em todos os campos do conhecimento humano, foram para fora do país. Em busca de trabalho digno. Aqui, não têm incentivo, não têm verbas, não têm futuro algum.
E, sem as cabeças pensantes que nos impulsionariam para o futuro, nos tornamos ainda mais ignorantes e limitados. Condenados a piorar cada vez mais.
Dói, dói muito ver meu país assim. E, acredito que, como em mim, essa dor esteja presente no dia a dia de milhões de brasileiros. Uma dor na alma.
Mas, por mais burros, limitados e covardes que sejamos não merecemos isso. Deveríamos, pelo menos, merecer a complacência com que se deve tratar os idiotas, ignorantes e fracos.
Mas, a classe política não tem mais nenhum escrúpulo e nem vergonha na cara. Solidariedade, humanidade, responsabilidade e verdade não existem no mundo sujo deles. Praticam a mentira e o escárnio a luz do dia com transmissão ao vivo, há muito perderam qualquer vestígio de decência. A impunidade com requintes de crueldade, é repugnante. Dá nojo ver uma sessão do congresso ou do STF.
Escarram na nossa cara e em seguida nos obrigam a engolir. Nojentos. Diariamente. Em TODAS as instâncias de poder. Executivo, legislativo e judiciário. Em TODAS as cidades, municípios, estados e no governo federal.
É triste, muito triste.
- Edmir Saint-Clair
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Nunca entendi direito o motivo da entrada do Padre Frederico na vida da minha família naquele início do ano de 1971. Meus pais não dividiam com os filhos quaisquer oscilações naturais da vida comum e aparentemente tranquila que levávamos. Mas, é claro que existiam e, naquele momento, eles resolveram recorrer a uma ajuda extra de um padre católico. A religião católica em si não era novidade lá em casa, ao contrário, fomos criados como toda nossa geração com aula de catecismo e primeira comunhão na Igreja Santa Mônica do Leblon. Mas, entre os irmãos ninguém tinha muito interesse pelo assunto. Cumpríamos o que nossos pais pediam, sem questionamentos, como todos os nossos amigos.
De um dia para o outro, um padre alemão, chamado Frederico, começou a ir todas as quintas-feiras à noite para cumprir o mesmo ritual: primeiro rezava uma pequena missa num altar improvisado na cômoda do quarto dos meus pais, seguido de um lauto jantar com pratos saborosos e diversificados. O padre sempre caía matando na refeição. Comia que nem um condenado e haja comida para sustentar aquele corpanzil. Ele era alto, cerca de 1,90m, louro de olhos azuis, um alemão bem alemão, inclusive nascido na Alemanha, como todo alemão tem que ser. Sua aparência, o sotaque forte e o jeito circunspecto faziam com que sua figura ganhasse ares extraordinários. Eu e meus irmãos quase não falávamos, mas, sentíamos a cerimônia daqueles momentos. Acima de tudo, era estranho.
Não durou muito aquele período, talvez pouco mais de meio ano, mas toda quinta-feira tinha missa e jantar do padre Frederico. Só lá em casa tinha isso e a gente não comentava com ninguém. Lembro-me de uma conversa, entre os adultos, de que era proibido rezar missa na casa de fiéis sem autorização prévia, o que ativou ainda mais minha curiosidade, afinal aquilo era algo proibido.
Certa ocasião minha mãe resolveu agradar mais o padre Frederico e conseguiu uma receita do tal do chucrute, um prato típico alemão, do qual nunca havíamos ouvido falar.
Quinta-feira, e lá foi ela para a cozinha preparar a receita junto com a nossa empregada, que era uma baiana que cozinhava divinamente, mas nunca tinha ouvido falar em chucrute.
Veio à noite, família reunida, padre Frederico aguçou nitidamente o olfato assim que adentrou a porta. E apressou-se em iniciar a “missa” que, naquele dia, foi bem mais curta. O padre estava com fome. Já na chegada meu pai o avisou que tinha uma surpresa gastronômica para ele no jantar. O padre, que não era de recusar prato algum, ficou ainda mais animado. Minha mãe notou a animação e segredou, igualmente animada, para nós:
- Ele sentiu o cheiro do chucrute!
Minha mãe deixou a finalização do chucrute aos cuidados da Zoraide e fomos para o quarto assistir a missa.
Quando voltamos para a sala, a mesa estava posta e diversos pratos, carne, ave e peixe o esperavam, além dos acompanhamentos, dentre eles o tal do chucrute.
O plano da minha mãe era não falar nada e deixar que o padre tivesse a agradável surpresa de descobrir o prato típico de sua terra natal no meio dos outros. Combinou conosco que ninguém deveria falar nada. Todos cumprimos à risca o trato.
O jantar transcorria normalmente, o padre foi se servindo, um a um, de todos os pratos com igual apetite, mas, nada de pegar o chucrute. De repente, minha mãe olhou para a travessa de chucrute e estranhou a cor da combinação que deveria ser só de repolhos e molho branco. Estava com a cor de azeite de dendê pálido dada a mistura com o molho branco. Sincronizadamente com a estupefação veladissima da minha mãe, padre Frederico pega a travessa e serve-se. A príncípio apenas um pouco, para provar. Ato contínuo, faz uma expressão de aprovação e serve-se fartamente daquilo que ninguém sabia o que era. Sorrindo, pergunta com seu forte sotaque:
- Muito gostosa esse comida. Gosta muita de azeita de dênde. Como chama?
Sem perder a pose, minha mãe respondeu:
- É uma especialidade da nossa cozinheira baiana.
Ele nunca soube que aquilo era um legítimo chucrute baiano, que acabara de ser inventado naquele momento.
Nunca soube por que o padre veio nem porque não veio mais. Mas, sempre que ouço falar em chucrute, lembro-me do chucrute baiano do padre Frederico.
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